segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

A Lonely Death


Certa vez me disseram que todos necessitam de uma razão para existir, uma raison d’êntre. O meu maior problema é que nunca a encontrei; nunca tive real motivo para viver, as coisas simplesmente aconteciam a minha volta sem que fizesse diferença para mim, logo, eu não intervinha no decorrer da existência — era desnecessário ao mundo.
Muitas vezes me iludi; muitas vezes encontrei algo ou, como sempre foi mais comum, alguém por quem eu pensei que poderia viver. Mas nunca ocorria como eu esperava, e eu sempre terminava mais descrente na vida do que antes.
Antes de citar o fato que me trouxe aqui, quero primeiramente dizer que sempre acreditei em deus; todavia, nunca fui daquelas pessoas que creditam a culpa de tudo que lhes ocorre na existência divina. Para mim o livre arbítrio existe para que possamos aprender e nos é necessário errar para alcançar uma vida próxima à perfeição do criador; ele não fica lá em cima nos controlando como marionetes, este não é o seu plano para conosco. Mas não nego que muitas vezes encontrei a mim mesmo duvidando disso; achando que, talvez, ele, ou qualquer outra existência superior a nós, divirta-se ao nos tirar tudo que consideramos importante. O fato que relato a seguir descreve bem o porquê desta minha forma de pensar.
***
Era o início da década passada, o primeiro ano desta, mas não consigo precisar ao certo o mês ou o dia. Os tempos eram de paz, ou assim o pareciam. Bem, para mim não importava muito, só o que queria era poder viver minha vida monótona. Vivia sozinho numa área um pouco afastada do centro da cidade. Assim como hoje, não podia me queixar quanto a minha vida profissional — persegui o que queria e alcancei meus desejos.
Estava, como sempre, tomando uma condução para casa. Era um ônibus pouco ventilado, lotado como sempre, e as mais condições da estrada somente agravavam mais ainda o desconforto da viagem. De pé, no fundo do veículo, com meus fones de ouvido e meu tocador de MP3 reproduzindo a um alto volume, mais somente para mim, alguma música antiga, provavelmente algum rock, gênero que sempre me agradou.
Olhei ao redor, dezenas de pessoas, todas pensando em algo — Em que seria? — Não faz diferença. Meu olhar parou ao encontrá-la; era linda, certamente, mas havia algo mais naquela visão que me atraía e obrigava-me a admirá-la, somente desviando o olhar vez ou outra, quando esta fitava em minha direção, para que ela não percebesse que eu a mirava.
Em casa a única imagem que vinha em minha mente era a dela. Essa sensação durou algum tempo, até que me ocupei de algumas tarefas inacabadas referentes ao meu emprego. Por fim tomei banho e fui dormir, pois já passava de meia-noite.
Dias se passaram, a rotina continuou e eu não a vi novamente. Até que, certo dia, num final de semana, eu entro numa loja para comprar algo que não me recordo o que era. Ela saía do estabelecimento, acompanhada de amigas, no exato momento em que eu entrava; mais uma vez fique somente a lhe admirar a beleza.
A terceira vez em que nos encontramos foi numa livraria. Sempre fui fã de estórias de terror e suspense e estava lá para ampliar um pouco mais o meu acervo pessoal. E que surpresa não foi a minha quando a vi indecisa entre dois livros: um de H.P. Lovecraft e outro de Edgar Allan Poe. Foi ela que primeiro falou algo.
— Com licença, você pode me ajudar? Eu estava querendo ler algo meio sombrio, mas não sei ao certo qual desses livros me agradaria. Eu o vi escolhendo alguns contos de terror, então, pensei que talvez você pudesse me aconselhar algo.
Eu, gaguejando, expliquei-lhe as características de cada autor. Ela escolheu um dos dois, mas eu estava tão nervoso que nem dei atenção a qual deles foi. Continuamos conversando depois que saímos da loja; descobri que tínhamos mais em comum do que a princípio eu imaginara.
Saímos mais vezes, como amigos, e aos poucos uma terna paixão foi crescendo entre nós. Começamos a namorar algum tempo depois e estávamos certos de que só precisávamos um do outro; nada mais. Os meses foram passando e tornaram-se anos; três, para ser mais preciso. Caso me perguntassem se alguma vez encontrei a felicidade, com certeza citaria este momento.
Mas quando o destino nos dá algo, o mais certo é que, cedo ou tarde, este nos tome algo de valor equivalente. O problema era que a única coisa que eu possuía e que tivesse valor igual a minha felicidade era ela.
Em abril de 2004, Sofia contraiu uma doença incurável até mesmo para a medicina mais moderna — qual a utilidade da ciência, se quando mais precisamos dela, esta nos abandona. — Os médicos, desacreditados, deram-lhe certeza de apenas mais três meses de vida.
Não foi fácil para mim, ter de ver a vida dela extinguindo-se aos poucos e, junto desta, a minha também. Ninguém conseguiria imaginar a tristeza pela qual passei, vendo-a sobre uma cama, nos seus últimos dias, definhando-se.
Sem sair do seu lado um só momento, estava sempre ali para segurar-lhe a mão. Mas no dia 15 de agosto do mesmo ano, Sofia se foi; acabara de perder minha amada.
Como fora ela a morrer e não eu, cogitei haver algum propósito certamente — era este pensamento que me trouxe vivo até o presente dia.
***
Após este acontecimento sinto-me como se vivesse num porão; onde não posso ver a luz e espero pela minha morte.
Dizem algumas pessoas que ao final deste ano acorrerá o “Fim dos Tempos”. Embora não acredite nessas crendices, imaginei que seria uma ótima data para o minha morte — 06/09/2012 — o dia de hoje.
Acordei cedo, o céu já estava coberto por nuvens, prenúncio de um dia chuvoso. E realmente o foi, começou a chover por volta das nove e ainda não parou. Ao sair de casa, não cogitei a hipótese de levar meu guarda-chuva, pois este não seria realmente necessário.
Andei sem rumo por diversas ruas, pessoas indo e vindo, cada uma vivendo sua vida, todas alegres por isso, e somente eu desejando o fim da minha o mais rápido possível. A estrutura da cidade me oprimia, sentia como se mesmo gritando com toda a potência da minha voz, esta seria ouvida apenas por meia dúzia de seres que não me conheciam, nem se importavam comigo ou com o que iria fazer.
Daqui do topo desta torre, vejo o firmamento tempestuoso, raios cortando em todas as direções. Não fossem as escuras nuvens, certamente seria visível um lindo luar, mas nem mesmo essa possibilidade me atrai. Olho para baixo, uns vinte metros me separam do chão.
O relógio abaixo de mim badalou sete horas há exatamente quinze minutos. Aproximo-me da borda, a chuva acariciando minha face faz-me lembrar de alguém.
— Sofia, esta é a sua chuva. — sussurro eu, para ninguém.
E por fim caminho para aquilo que menos queria neste mundo — uma morte solitária —, mas não há motivos para continuar vivendo quando a vida não mostra mais sentido. E sendo este o único meio de reencontrar minha amada novamente, abraço confiante este destino. Uma última palavra para este mundo ao qual nunca pertenci — Adeus.

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